domingo, 27 de novembro de 2011

Abuso de Poder Apimentado

Spray de pimenta ou gás-pimenta é um agente lacrimogénio (composto químico que irrita os olhos e causa lacrimejo, dor e mesmo cegueira temporária) usado pelas forças de segurança para controlo de distúrbios civis.



Depoimento de quem sofreu na pele o abuso de poder e o “tempero apimentado” da PM de são paulo.


Caros amigos, venho por meio desse blog compartilhar o acontecido dessa última madrugada do dia 27/11/11. Peço por favor, que deem a devida importancia ao fato. não estou escrevendo apenas para delatar o que eu sofri, mas também o que eu vi acontecer com muitas pessoas, em sua maioria, jovens.

Lá pelas quatro horas da manhã do dia 27 de novembro, estávamos eu, alguns amigos e chegados sentados conversando e bebendo na Rua Peixoto Gomide, travessa da Augusta e da Frei Caneca. Tudo corria na mais perfeita ordem até então. Pessoas conversavam, bebiam e se divertiam como manda o final de semana. Quando ouvimos uma explosão, na hora ninguém entendeu muito bem do que se tratava, continuamos sentados, até que vieram mais duas explosões seguidas. Olhei para o começo da rua e só vi uma fumaça branca, na mesma hora meu olho e minha boca começaram a arder, comecei a lacrimejar e a única reação, que foi em um todo, era correr. Não sei exatamente quantos jovens havia naquela rua e naquele momento. O pouco que a minha visão afetada pelo gás de pimenta conseguia enxergar era uma multidão que corria cada um para o seu lado. Alguns ainda se prestavam a orientar os outros para onde correr. Foi quando percebi que estávamos praticamente cercados. Viaturas passavam e jogavam bombas de efeito moral, que segundo histórias contadas no momento de euforia, teria acertado o braço de uma garota que ficou muito machucada. Dizem que ela foi levada por uma viatura, mas me limito a falar apenas do que eu presenciei.
Eram umas oitenta pessoas, para mais, subindo correndo até a Paulista pela Rua Frei Caneca. O desespero começava a tomar conta, perdi pessoas pelo caminho e as reencontrei de novo mais a frente. Era dificil manter um auto controle em uma situação que você é a minoria sendo atacada sem nem saber o por quê.
Ao chegar na esquina da Avenida Paulista com a Augusta, ainda tentando me recuperar da ardencia nos olhos e na boca, tentávamos descobrir se estava todo mundo bem e procurávamos mais informações do acontecido. E ai vai uma versão de por que a PM cercou aquela rua e “temperou” todo mundo com pimenta:
É de conhecimento geral que existem algumas gangues por ali, e que é muito comum acontecerem brigas entre eles. Punks, skins, nazi, etc. Pelo que eu pude ouvir, me parece que as pessoas já sabiam que haveria uma briga naquela madrugada, mas não que tomaria essa proporção. A polícia alega que estava nos defendendo, e eu me pergunto: me atacando para me defender?
Há também a hipótese de algum vizinho daquela redondeza ter denunciado algo, o que eu acho pouco provável.

De volta ao tumulto. A adrenalina não baixava. A indignação pelo abuso de poder e a violência gratuita com quem não tinha relação nenhuma com o caso só aumentava. Não sentia sono, não sentia fome, não sentia frio, só sentia um mix de raiva com um sentimento de injustiça. Não podiamos ficar ali esperando que no próximo fim de semana aconteça a mesma coisa. Alguém de fora precisava nós ouvir, alguém precisava contar para as pessoas o que viu lá em baixo. Juntei-me a mais uma amiga e fomos divulgar o acontecido para quem realmente se prestaria a ouvir, os manifestantes do ‘Ocupa Sampa’. repassei essa história umas dez vezes, sabíamos que ali nós teríamos algum apoio, seriamos finalmente ouvidos. Depois de passar essa informação para o maior número de pessoas, resolvemos voltar para verificar as quantas andavam as coisas por lá. Tudo parecia ter se acalmado, e aos poucos eu fui me acalmando também. Quando eram umas sete horas da manhã resolvemos ir até o vão do MASP tomar um café. E como se não bastasse todo esse tumulto, no meio do caminho escontramos com alguns punks discutindo com dois policiais. Ficamos de longe assistindo, e ali presenciamos cenas que eu jamais esqueço. Vimos um cara levar uma cabeçada de um policial simplesmente por tentar apasiguar as coisas. Estava acontecendo tudo de novo, mas dessa vez em plena luz do dia e em plena Avenida Paulista.
Estávamos prestes a ir embora e deixar aquela confusão com eles, quando um policial puxou uma garota que estava com a gente pelo colarinho. Nesse momento o sangue ferveu. Bater em uma garota já era o cúmulo! Enquanto eu tentava tira-la do meio da confusão outros garotos provocavam a polícia de maneira agressiva, o que eu já tinha certeza que não ia terminar bem. Só queria tira-la daquele lugar, e foi quando um PM olhou para mim e disse: “Tira essa tampinha daqui!”, e eu respondi: “Calma senhor, sem violência!”. Não deu tempo. Eu estava no final da frase quando ele jogou spray de pimenta dentro da minha boca e em cima de todas as pessoas que ali estavam. A raiva retornou mais forte ainda, a vontade era de sair quebrando tudo, mas eu tinha de me controlar, não podia perder o controle. A polícia vinha para cima agressivamente com cacetetes, gritando e mandando a gente ficar longe. Ameaçavam-nos com spray novamente, mas nessa altura do campeonato eu já não ligava para mais nada. Como podemos viver em uma sociedade em que, teoricamente, a polícia existe para te defender, mas no final das contas sabemos bem que isso não é verdade? Nesse instante passou o pensamento de que eu amanheceria o domingo na DP. Era como uma praga, a polícia estava em todos os lugares, tudo era motivo para ser agredido, já não dava mais pra respirar com aquele cheiro de pimenta. Das quatro da manhã até aquele momento o tempo voava. Não era fácil ficar ali de um lado para o outro tentando se proteger de qualquer ataque surpresa. E como se não bastasse a violência da polícia, alguns skinheads resolveram atacar em plena Rua da Consolação. A baderna estava formada mais uma vez. Parecia dia de encrenca, eram por todos os lados, coisas eram tacadas, garrafas, pedaços de madeira, entre outros objetos. Saber que um deles estava armado só piorava a situação, eu não queria ir embora, queria tirar as pessoas daquele lugar, mas ao mesmo tempo queria presenciar essas cenas que jamais serão mostradas no Jornal Nacional. E foi acontecendo assim. Polícia de um lado, skinheads do outro. Pura repressão. E eu me pergunto: Até quando? Até quando eu vou ter de me preocupar se vou ser atacada por bombas de efeito moral na mesa de um bar? Até quando todo mundo vai se calar diante da violência de gangues que tem como base o puro preconceito? Até quando eu vou suportar o abuso de poder? Até quando eu vou engolir pimenta?

O fato é, nada explica o ato de violência de ambas as partes. Que sejam penalizados aqueles que tem de ser penalizados. Mas que isso não respingue em pessoas de bem, que não fizeram nada para merecer. Generalizam-nos como marginais. É muito fácil atacar alguém que não tem como se defender.
Indignação, raiva e injustiça. É só isso que eu consigo sentir quando eu me lembro da madrugada passada. Não acabou hoje, nem vai acabar amanhã. Violência gera violência.
Continuo pensando e digerindo tudo...

Compartilhem por favor, se vocês conseguiram sentir um pouco do que eu e muitas pessoas passamos. Obrigada!


Maya Costa

4 comentários:

  1. Olha, como eu vou saber se vc tá falando a verdade?

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  2. Ah sim, pq ela ganharia muito mentindo né? Aff ¬¬'

    O pior cego é aquele que não quer ver, estamos a caminho de tempos perigosos.

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  3. Se eu fosse me prestar a mentir, inventaria uma mentira bonita, um conto de fadas ou até mesmo uma crônica... Não uma história dessa proporção...

    Acredite se quiser.

    É mais fácil aturar a tristeza generalizada do que romper com as correntes de preguiça e mal dizer.

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  4. Prezado Eh Nois,

    Como vc vai saber se o JN está falando a verdade?

    Pense sobre isso.

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